Um estudo coordenado pelo Centro para o Monitoramento da Conservação Mundial do Programa da ONU para o Meio Ambiente revela que, numa lista de nove países, o Brasil é o que menos investe na preservação de cada hectare de suas florestas. Enquanto o Brasil desembolsa, em média, R$ 4,43 por cada hectare de suas unidades de conservação, na Argentina o índice é cinco vezes maior (R$ 21,37), no México, nove vezes (R$ 39,71) e, na África do Sul, 15 vezes (R$ 67,09).
A disparidade é ainda maior se os gastos brasileiros são comparados com os de países desenvolvidos: nos Estados Unidos, país da lista que mais investe na conservação ambiental, são R$156,12 por hectare (35 vezes a mais que o Brasil) e, na Nova Zelândia, R$ 110,39. A lista, integrada também por Costa Rica, Canadá e Austrália, agrega países que, a exemplo do Brasil, têm grande parte de seus territórios ocupados por parques naturais ou índices sociais semelhantes aos brasileiros.
O estudo "Contribuição das unidades de conservação para a economia nacional", divulgado neste mês e feito em parceria entre o IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e o Ministério do Meio Ambiente, calculou quanto o Brasil fatura com a preservação de suas florestas e quanto poderá ganhar caso amplie os investimentos no setor, o que permitiria maior aproveitamento de seus recursos naturais e incremento no número de turistas.
Um dos autores do estudo, o pesquisador da UFRJ Carlos Eduardo Young, diz à BBC Brasil que a intenção foi mostrar que a preservação ambiental e o desenvolvimento econômico são compatíveis. Segundo ele, é preciso resistir ao impulso de tirar um proveito econômico de curto prazo das florestas, em nome de um desenvolvimento mais duradouro e inclusivo. "Nós comprovamos que, do jeito que está, as florestas brasileiras já garantem à sociedade um retorno financeiro superior ao que é investido nelas. Se melhorarmos o sistema de gestão, o valor do benefício pode crescer significativamente."
Investimentos
O estudo calcula que, caso o governo garanta a conservação nessas áreas e invista mais nelas, o aproveitamento econômico desses territórios, que cobrem cerca de 15% do país, pode gerar ao menos R$ 5,77 bilhões por ano. O valor viria de produtos florestais (como castanha-do-pará ou madeira em áreas de extração controlada, por exemplo), turismo, estoque de carbono conservado, água e receitas tributárias, baseada no modelo de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) Ecológico adotado por alguns Estados.
Para isso, no entanto, Young diz que o país teria de ampliar os investimentos no setor, atualmente em torno de R$ 300 milhões por ano nas reservas federais, para cerca de R$ 550 milhões anuais para o sistema federal, R$ 350 milhões para os sistemas estaduais (a serem empregados sobretudo em maior fiscalização), além de cerca de R$ 1,8 bilhão para gastos em infraestrutura para o turismo. Hoje, segundo o estudo, há um funcionário brasileiro para cada 18.600 hectares protegidos, número bastante inferior aos da África do Sul (1 para cada 1.176 hectares), dos Estados Unidos (1 para 2.125), Argentina (1 para 2.400) e Canadá (1 para 5.257).
Ainda de acordo com o estudo, a exploração legal de produtos oriundos de florestas naturais já gera cerca de R$ 3,79 bilhões ao Brasil por ano, ao passo que a receita de ICMS Ecológico repassada aos municípios pela existência de unidades de conservação em seus territórios é de R$ 402,7 milhões. Não há dados abrangentes sobre receitas advindas do turismo.
Young explica, no entanto, que os benefícios econômicos da preservação ambiental são ainda mais amplos, já que grande parte da água que abastece as usinas hidrelétricas nacionais, provendo energia às indústrias e às cidades país, advém de unidades de conservação ambiental; que o turismo em áreas protegidas é fonte central de recursos para muitos municípios brasileiros; e que o desenvolvimento de fármacos e cosméticos muitas vezes se dá por meio de pesquisas sobre espécies vegetais protegidas em unidades de conservação. Mesmo assim, diz que, por se tratar de produtos e serviços em geral de natureza pública, seu valor não é percebido pela sociedade, que na maior parte dos casos não paga diretamente pelo seu consumo ou uso.
O pesquisador afirma ainda que a dicotomia agricultura X conservação ambiental, que ganhou força durante as discussões sobre o novo Código Florestal que tramita no Congresso, é falsa: "Não somos contra o desenvolvimento da agricultura, muito pelo contrário. Achamos, aliás, que a conservação ambiental favorece os agricultores, na medida em que lhes garante água para a irrigação, ameniza efeitos de enchentes e impede a erosão de terrenos montanhosos, que podem ser muito prejudiciais aos produtores".
Ele alerta, no entanto, que caso o novo Código reduza as áreas mínimas de conservação exigidas em cada propriedade, o país abrirá mão de uma riqueza maior. "Vivemos um momento decisivo, que determinará se saberemos usar os recursos naturais valiosos de que dispomos e que são um dos nossos maiores diferenciais", afirma.
Fonte: BBC BRASIL