Um morro íngreme no sudeste da Bolívia guarda mais de 5 mil pegadas de
animais, algumas de até um metro, que datam de mais de 65 milhões de
anos. Mas esse tesouro paleontológico está ameaçado pela atividade
humana.
O morro, chamado Cal Orcko (montanha de cal, em quéchua), é uma das
maiores jazidas de fósseis de pegadas do mundo. Fica nos arredores da
cidade de Sucre, no sudeste dos vales bolivianos.
Na esplanada de terra, é possível ver fileiras de pegadas em diferentes
direções. Os diâmetros variam em tamanho, e as formas revelam o
contorno das patas, sobretudo, de saurópodes, tiranossauros, terópodes,
ornitópodes e anquilossauros.
Ao todo, há 5.055 pegadas individuais de animais de pelo menos oito
espécies diferentes e 462 rastros contínuos, ou seja, sequências de
pegadas.
"Como jazida paleontológica de pegadas, Cal Orcko é uma das maiores do
mundo", afirmou o cientista boliviano Omar Medina, integrante da
Sociedade Científica Universitária de Paleontologia (Sociupa).
O local recebe 120 mil visitas ao ano.
"É a maior jazida paleontológica do mundo e, para mim, é o máximo. Os
turistas vão embora alucinados, surpresos", contou o morador Juan Carlos
Molina.
Perto desse sítio natural, fica a fábrica de cimento Fancesa, que
retira calcário da pedreira vizinha, ininterruptamente. Os donos da
empresa são o governo regional, a prefeitura da cidade e a universidade
estadual local.
"O precipício foi bastante afetado, porque foram muitos anos de
trabalho tirando matéria-prima", explicou à AFP Elizabeth Baldivieso,
administradora do Parque Cretáceo, fundação privada que cuida do local.
Segundo Elizabeth, uma parte norte da região está em perigo, enquanto a parte sul será protegida.
Já o secretário de Turismo e Cultura do Governo de Chuquisaca, Juan
José Padilla, disse à AFP que essa é "uma visão um pouco alarmista do
tema", alegando que Fancesa se comprometeu a apoiar a preservação do
local.
Os vestígios registrados em Cal Orcko são maiores do que os existentes
em outras reservas, como Lark Quarry (Austrália), Yanguoxia (China) e
Altamira (Espanha), de acordo com uma pesquisa feita pelo Parque
Cretáceo.
Pegadas em uma superfície quase vertical
Curiosamente, as pegadas registradas nesta montanha de cal, com 1,5 km de extensão e 110 metros de altitude, estão sobre uma rocha com 72 graus de inclinação.
A presença desses rastros em uma superfície quase vertical é um
fenômeno que sempre desperta a curiosidade dos visitantes, contou
Medina, mas a explicação é o movimento das placas submarinas.
"Uma vez que os dinossauros se extinguem no Terciário, nosso planeta
começa a sofrer grandes movimentos orogênicos, movimentos de placas
tectônicas, de deslizamento de continentes, e as placas marinhas começam
a provocar aqui uma espécie de efeito sanfona", afirmou o especialista.
Em outras palavras, até 65 milhões de anos atrás, ao final do Cretáceo,
esse morro era uma lagoa, habitada por diferentes espécies que deixaram
suas pegadas no barro. O espaço aquífero secou, as marcas foram seladas
e, finalmente, os movimentos orogênicos colocaram a planície em posição
quase vertical.
A visualização das marcas começou em meados da década de 1990, pela
própria ação do tempo, da chuva e da erosão. Além disso, parte do morro
ficou descoberto depois que a fábrica Fancesa começou a explorar a
pedreira de calcário.
Em 2009, a Bolívia inscreveu Cal Orcko na Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), como patrimônio
natural da humanidade. A entidade recusou o pedido, justamente em
observação às políticas de preservação.
Após as objeções, o projeto será reformulado e apresentado novamente ao órgão em 2015.
G1
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