Em maio deste ano, o governo federal anunciou novas medidas de
estímulo à produção industrial para tentar manter o emprego e a renda em
alta. Como já ocorreu nas vezes anteriores, o “remédio” virá por meio
de incentivos fiscais a setores da indústria e, novamente, o mais
beneficiado será o setor automotivo. Desta vez, a maior parte dos
benefícios foi direcionada para os veículos incluídos no Regime
Automotivo do Mercosul, com a redução nas alíquotas do Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI). Essa redução vale até o final do ano.
Manter aquecido o mercado de automóveis é uma necessidade das
economias de alguns países emergentes, como o Brasil. Aqui, as
montadoras mantêm mais de 130 mil empregos. E cada emprego criado na
indústria montadora pode gerar outros dez postos de trabalho no amplo
universo da indústria automotiva, da mineração ao comércio. Os cálculos
são da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
A Receita Federal estima que o Tesouro Nacional deixou de arrecadar,
este ano, só por conta desses incentivos aos carros, mais de R$ 1
bilhão. No geral, ainda segundo esse órgão, a Lei Orçamentária Anual
(LOA) de 2014 previa um gasto tributário de quase R$ 250 bilhões,
correspondendo a 5% do PIB ou a dez vezes o gasto com o Bolsa Família,
que atende 50 milhões de pessoas.
Algumas isenções são pertinentes, pois envolvem desonerações de
importações de equipamentos de alta tecnologia, incentivo a segmentos
econômicos de alta inovação ou com grande potencial de inclusão social.
Mas outros, não seria o caso de a sociedade se perguntar se vale a pena
pagar por eles? Porque, em última instância, é isso o que acontece:
carros mais baratos são financiados pelos impostos de todos. É isso o
que queremos neste momento? Não haveria outras maneiras de se manter
emprego em alta com o estímulo a setores que também ajudem a construir a
economia do futuro? Ou será que não há saída para a nossa indústria e
as nossas cidades que não a produção indiscriminada de automóveis?
Essas reflexões me vieram à mente quando li recentemente que a
capital da Finlândia, Helsinque, quer se livrar dos carros individuais
até 2025. Claro que não vai impedir nem proibir a aquisição de veículos
pelos cidadãos. Todavia, pretende promover uma revolução na mobilidade
de tal maneira que as pessoas prefiram o transporte público ao
individual.
Menor desigualdade ajuda
A Finlândia é um país da Escandinávia, no norte da Europa, que ocupa o
24º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), com 0,879 (muito
alto). Ajustado pela desigualdade, novo cálculo introduzido este ano
pela ONU, o IDH da Finlândia fica em 0,830, mantendo o país na mesma
classificação. Portanto, trata-se de uma nação com baixo índice de
desigualdade e bem-estar distribuído de forma bastante igualitária para
toda a população.
O projeto de Helsinque para livrar as suas ruas dos carros até 2025
(em onze anos, portanto) usa respeito à cidadania, bom senso e
aplicativos de internet, bem como melhoria ainda maior dos transportes
públicos.
A ideia é tornar o transporte público tão eficiente que nenhum
morador da cidade pense em utilizar carro quando precisar se locomover
pelas ruas da capital, não importa a distância a percorrer. Para tanto, o
ônibus, o veículo leve sobre trilhos (VLT), o trem ou outra forma de
mobilidade pública será transformada numa estrutura mais personalizada e
prática, com o uso da tecnologia e da internet.
O funcionamento será assim: todos os modais oferecidos pela prefeitura serão interligados e gerenciados por um software para
evitar atrasos, prevenir acidentes e avisar os usuários com
antecedência sobre problemas ocorridos nas diversas linhas. Esse software poderá ser baixado no celular, no computador pessoal ou acessado em locais públicos, como praças, bancos, shoppings e escolas. Os usuários conseguirão ter acesso aos horários, trajetos e outras informações por meio desse aplicativo.
Pelo celular, o usuário também poderá solicitar ao motorista parada
fora do ponto, com antecedência, para maior comodidade, como já existe
num serviço de micro-ônibus na cidade. Esse aplicativo também permite o
aluguel de bicicletas, o agendamento de táxis e o compartilhamento de
automóveis.
Muitos podem pensar que essa solução só é possível para uma cidade
como Helsinque, que tem em torno de 500 mil habitantes. Entretanto, aqui
no Brasil não temos soluções criativas de mobilidade nem em cidades
menores. Então, a questão é de vontade política.
Em São Paulo, os motoristas de ônibus já são obrigados por lei a
parar fora do ponto para idosos, gestantes e pessoas com deficiência.
Por que não aproveitar o potencial da tecnologia e da internet para
estender essa comodidade a todos.
DCM
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