O último Relatório Mundial nas Nações Unidas sobre o Desenvolvimento de Recursos Hídricos deu um alerta:
"Na medida em que cresce a demanda de recursos hídricos no mundo, diminui a probabilidade do fornecimento de água doce em muitas regiões, como consequência da mudança climática".
José Tundisi, membro da Academia Brasileira
de Ciências e doutor em Ciências pela USP, afirma que a escassez de água
já é um problema real, e não mais uma questão com a qual teríamos que
lidar no futuro. "Relatórios chamam atenção para isso. Até 2050 isso já
vai ser muito claro, são pesquisas baseadas em dados. Ainda não está em
nível planetário, mas vamos ter abundância de água em algumas regiões e
escassez em outras", prevê.
A escassez de água
causaria, obviamente, mudanças relevantes. "Uma escassez aqui no Brasil
poderia ter efeitos
catastróficos para a economia, já que oitenta por cento da energia do
país vem da água. Também teria aumento de doenças de veiculação hídrica e
deterioração da qualidade da água", aponta Tundisi.
O doutor destaca que a principal saída seria transformar água salgada em água doce: "O custo da dessanilização
ainda é alto, mas está baixando. Em alguns lugares isso já é realizado, ou está quase, como Israel, Barcelona e Kuwait". Ele também sugere outras soluções, como "fazer um grande projeto de proteção para conservar as águas
nas bacias hidrográficas e melhorar o reuso e implantar um sistema de conservação nas áreas urbanas e na agricultura".
O
presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, denunciou, nesta
quinta-feira (10), que aquecimento global não está sendo levado a sério e
que o tempo está se
esgotando para evitar consequências como a seca e a inundação de
cidades. Ele defendeu que "o aquecimento de 2 graus Celsius vai ter
grandes implicações”, indicando que “40% das terras aráveis da África
desaparecerão e a cidade de Bangcoc poderá ficar submersa”. "Daqui a dez
ou 15 anos, quando começarem batalhas devido à falta de acesso à água e
à comida, estaremos todos aqui sentados pensando: meu Deus, por que não
fizemos mais àquela altura?", completou.
David
Zee, doutor em geografia ambiental e professor de oceanografia da UERJ,
vai além das consequência negativas na
produção de energia, no caso de uma escassez. "Afetaria muito a
economia. O Brasil exporta água. Exporta alimentos. Grande parte dos
produtos industriais depende da água. Para produzir uma tonelada de
cereais, precisa de uma tonelada
de água", afirma. Ideval Costa, geólogo da USP, é ainda mais
contundente: "Precisa de água para produzir. Sem produção, não tem
economia. É uma questão de logística".
O professor de
oceanografia destaca que a sociedade já passou do sinal amarelo. Ele chama atenção
para o problema que São Paulo
está enfrentando. Nesta terça-feira (8), o volume de água no
reservatório de Cantareira, em São Paulo, marcava 12,7%, nível
considerado muito baixo. A crise provocou a incerteza sobre um possível
rodízio de água. "O sinal amarelo já veio há muito
tempo. Vai faltar água. Isso já é uma realidade e as pessoas estão
começando a discutir. Um sinal claro disso é o que está acontecendo em
São Paulo. Vai ter um conflito interno no Brasil pela água", acredita.
Zee aproveita para fazer uma importante
crítica: "O Brasil desperdiça demais, a começar pelos órgãos
governamentais, inclusive as empresas que produzem e distribuem água".
Costa
também concorda que a escassez de água não está longe e explica que, na
verdade, sempre foi uma "possibilidade real". "Desde que a
Terra começou seu processo de formação de vida. A água não vem todo ano
renovada, ela existe desde o começo de tudo. O que acontece é: aumenta
a população, aumenta a demanda", explica. Segundo ele, é certo que um
dia a água irá acabar: o questionamento é quando. Isso dependeria
"da quantidade de pessoas, de quanto vai aumentar o consumo e de como as
autoridades vão criar recursos para minimizar o problema". O geólogo destaca
a necessidade da "conscientização da população de que isso é natural da
Terra e que estamos aqui de passagem". "Tudo está muito próximo
em termos de tempo geológico", conclui.
*Programa de Estágio do Jornal do Brasil
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