Os produtores rurais da região do
semiárido do Nordeste estão reclamando da demora e da burocracia nas
ações governamentais anunciadas para socorrer as cerca de 10 milhões de
pessoas que sofrem com a maior estiagem dos últimos 40 anos na região.
Os trabalhadores do campo cobram ações mais rápidas contra os prejuízos já causados pela falta de chuva.
Segundo representantes de produtores rurais ouvidos pelo UOL,
apesar dos vários programas e ações anunciados pelo governo federal e
estaduais, boa parte da ajuda não consegue chegar às vítimas da seca,
seja por problemas logísticos ou por excesso de exigências.
Desde o agravamento da seca, no início
do ano, várias ações e envio de recursos foram anunciadas pelos governos
federal e estaduais.
A principal política pública é o envio
diário de carros pipa a todas as comunidades afetadas pela estiagem.
Outras ações –como apoio a distribuição de alimento para os animais e
crédito para os produtores– estariam enfrentando problemas.
Segundo os nordestinos afetados, apesar de não faltar água potável, há outras carências graves e que causam prejuízo econômico.
O principal problema apontado pelos
produtores é a falta alimento para os animais, que representavam a renda
de muitos sertanejos.
O rebanho continua morrendo nos terrenos
e sítios da zona rural. Além disso, os financiamentos anunciados pelo
governo federal não estariam chegando ao produtor rural.
“A ajuda não está chegando nem na
quantidade, nem velocidade que a gente entende que seria necessária.
Estamos fazendo uma série de cobranças ao governo federal e estadual.
Tivemos hoje [quarta-feira] uma reunião com o arcebispo de Recife e
Olinda [Dom Fernando Saburido] para darmos início a uma campanha de
arrecadação de água para consumo humano. Temos municípios entrando em
colapso. Pedimos também para a Igreja cobrar o governo. Vamos tentar
criar uma conta e pedir aos empresários que depositem recursos para
realização de obras para que se somem às que o governo diz que vai
fazer, como cisternas e barragens subterrâneas”, afirmou o presidente da
Fetape (Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Pernambuco),
Doriel Barros.
Segundo Barros, diante do cenário
“gritante”, os trabalhadores e produtores rurais pretendem se organizar e
cobrar medidas mais enfáticas, na próxima semana, ao governo federal e
aos governadores.
“Estamos indo a Brasília com
representantes das federações estaduais do Nordeste para organizarmos um
evento regional. A ideia é fazer reunião chamando governadores, a
presidente Dilma e ministros para discutirmos ações. A situação está
séria, e a burocracia é grande. O que percebemos é que o governo não se
preparou para enfrentar um momento como esse”, disse.
Morte de animais
A consequência direta da falta de ajuda
seria a morte dos animais pelo sertão. Em Pernambuco, a estimativa da
Fetape, por exemplo, é que a seca resulte em 800 mil mortes até o fim do
ano.
Sem alimento para fornecer aos animais, os produtores estão abandonando os animais, que morrem de fome à beira de rodovias.
No Rio Grande do Norte, a estimativa é
que 65% do rebanho morra ou seja vendido antes da hora para abate por
conta da falta de alimento.
“O governo federal tem um programa
emergencial de crédito, mas que é um mentira, que de emergencial não tem
nada. A burocracia é normal. Há um fluxo de projetos no Banco do
Nordeste travadíssimo. É um ‘check list’ muito grande. No Rio Grande do
Norte, por exemplo, somente 2% do público teve acesso a esse crédito”,
disse Gilberto Silva, assessor técnico da Federação dos Trabalhadores em
Agricultura do Rio Grande do Norte.
O representante também questiona a falta
de distribuição de comida para os animais. “A entrega do milho, que é
um paliativo, não chega ao Nordeste porque não há logística. Tudo isso
estamos reclamado. Estamos pedindo também a prorrogação do Garantia
Safra. O Bolsa Estiagem é um valor irrisório [R$ 80 por mês], uma
esmola. Fizemos uma pauta do Grito da Terra, em maio, mas até agora nada
foi feito. A situação está complicadíssima.”
Com as previsões de chuva apenas a
partir do início do próximo ano, a perspectiva é que os produtores
rurais só se recuperem na metade do ano de 2013.
“Mesmo que chova em março, como nos
apontam, só teremos produção em junho e julho. O abastecimento que chega
pelos carros-pipa é de água potável, e não atende às necessidades dos
animais. As adutoras prometidas são demoradas, só vão estar prontas na
próxima seca”, completou.
Os mesmos problemas estão sendo
enfrentados pelos produtores rurais da Paraíba, onde mais de 80% dos
municípios estão sendo afetados pela estiagem.
“A burocracia é muito grande,
especialmente para os financiamentos. Nenhum assentado tem como acessar
esse crédito. Outra coisa: a política federal do milho para os pequenos
produtores foi lançada, mas esse milho não chega ao Nordeste.
Recentemente tem melhorado a situação, mas ainda é muito pouca a
distribuição. E olhe que a gente vai sempre a Brasília, conversa, mas a
demanda é grande”, afirmou Ivanildo Pereira Dantas, assessor técnico da
Federação dos Trabalhadores da Agricultura da Paraíba.
Ações
Em resposta ao UOL, no
fim da tarde desta terça-feira (14), o Ministério da Integração Nacional
–responsável federal pela coordenação dos trabalhos de assistência
às vítimas das seca– informou que apenas autoriza e repassa o dinheiro
para crédito especial, com as devidas orientações, ao BNB (Banco do
Nordeste), que é responsável pela operação dos financiamentos. Sobre a
demora na entrega do milho, o ministério afirma que se trata de
responsabilidade da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).
Em seu site, o BNB informa que destinou,
esta semana, mais R$ 500 milhões para Programa Emergencial para a Seca e
que os empréstimos estão sendo concedidos.
“Com o aumento, o total disponibilizado
para financiar empreendedores urbanos e rurais atingidos pela estiagem
na área de atuação do BNB chega a R$ 1,5 bilhão, dos quais o Banco já
contratou R$ 1,2 bilhão, com 158 mil operações realizadas, em 1.250
municípios de sua área de atuação. Estão ainda em fase de contratação
mais R$ 198 milhões em propostas”, informa a instituição.
A reportagem do UOL também entrou em contato com a Conab e aguarda resposta do órgão.
Nesta terça-feira (13), a presidente
Dilma Rousseff lançou o programa “Mais Irrigação”, que prevê
investimentos de R$ 10 bilhões, sendo R$ 7 bilhões captados com a
iniciativa privada. Ao todo devem ser beneficiados 538 mil hectares de
áreas destinadas produção de biocombustíveis, fruticultura, leite carne e
grãos.
UOL