Estudo sugere que a redução da variedade
de espécies causa impactos tão graves ao meio ambiente quanto a
poluição e as mudanças climáticas
» Max Milliano Melo
No topo da lista de problemas ambientais
mais urgentes, constam questões como as mudanças climáticas, o buraco
na camada de ozônio e a poluição ambiental, devido aos efeitos que esses
fenômenos podem causar no planeta. A perda da biodiversidade é, em
geral, deixada em segundo plano, vista mais como um reflexo das
agressões do que como uma causa de mais problemas. Uma pesquisa
divulgada na edição de hoje da revista científica Nature, contudo,
alerta que, na natureza, diversidade significa quantidade e qualidade.
De acordo com o grupo de várias universidades dos Estados Unidos
envolvidas na análise, a diminuição da variedade de espécies animais e
vegetais é tão nociva à produtividade dos ecossistemas quanto a poluição
e as alterações no clima.
Para mensurar os efeitos da redução da
biodiversidade no ambiente, os pesquisadores analisaram dados de 192
estudos anteriores sobre todas as regiões do mundo, incluindo oceanos e
ecossistemas de água doce. O resultado da análise mostra que, em áreas
onde ocorre a perda de 21% a 40% da variedade de espécies — seja por
desmatamento, caça ou pesca predatórias, por exemplo — há redução na
produtividade semelhante à sentida por causa das mudanças climáticas ou
pela poluição ambiental. E diminuições mais altas, entre 41% e 60%, são
tão nocivas quanto a acidificação ou a elevação intensa na produção de
dióxido de carbono (CO2).
O pesquisador norte-americano Bruce
Hungate, da Universidade do Norte do Arizona, explica que, além de um
efeito direto, relacionado à perda de espécies, a queda da
biodiversidade gera um enfraquecimento de todo o ecossistema. "Extinções
definitivas. É triste perder definitivamente a diversidade biológica.
Nosso novo trabalho mostra que esses efeitos são tão grandes quanto
outras formas de mudança global", conta o cientista. "Quando o ambiente
perde a metade das espécies vegetais em uma área, o crescimento da
planta é afetado como se ela tivesse sido banhada em chuva ácida",
alerta.
A gama de dados analisados permitiu aos
pesquisadores constatarem que nenhuma região está a salvo. "Pode até
haver ecossistemas que são mais ou menos sensíveis, mas em todos onde há
dados disponíveis existe um padrão geral de que a perda de espécies tem
impactos grandes", explica Hungate. "Encontramos efeitos bastante
consistentes de perda de diversidade em água doce, terrestres e dos
ecossistemas marinhos no conjunto de estudos que avaliamos. Em média, há
perdas de aproximadamente 13% na produtividade com uma redução de 50%
da diversidade. Muitos de nós ficamos surpresos com a força dos efeitos
em relação às outras alterações ambientais que avaliamos", afirma David
Hooper, pesquisador da Universidade de Washington Ocidental e líder do
estudo divulgado na Nature.
Embora os pesquisadores já soubessem que
a perda de diversidade reduz a produtividade dos ecossistemas, esse foi
o primeiro grande estudo a mensurar esse prejuízo. "Nós já sabíamos há
muito tempo que a biodiversidade afeta a produtividade e a
sustentabilidade dos ecossistemas", explica Bradley Cardinale,
especialista da Universidade de Michigan. "Já sabíamos que a perda de
diversidade pode comprometer os bens e serviços que os ecossistemas
prestam, como alimentos, água potável e um clima estável. Mas não
sabíamos como a perda de diversidade é importante comparada aos outros
problemas ambientais que enfrentamos. Bem, agora sabemos que está entre
os cinco maiores problemas ambientais globais."
Ameaças
Vista normalmente como uma consequência
de outros problemas ambientais, a queda da variedade de espécies,
segundo os pesquisadores, passa a ter um papel de protagonista do
processo. "Onde eu moro, perto do Puget Sound, no estado de Washington
(Estados Unidos), temos aproximadamente 25 espécies ameaçadas de
extinção, desde flores pequenas ao rei salmão e a baleias orca", relata
David Hooper. "Embora algumas dessas espécies possam desaparecer para
sempre com apenas um sussurro, outras são muito importantes,
economicamente e culturalmente. Sua extinção representaria uma grande
perda de renda para pessoas que dependem, por exemplo, da pesca e do
turismo", completa.
O líder do estudo afirma ainda que os
efeitos da redução da diversidade ameaçam direta a humanidade. "Se
pensarmos sobre a biodiversidade de forma mais ampla, a perda de
componentes da paisagem-chave pode botar em risco as pessoas", opina.
"Por exemplo, perda de matas ciliares pode pôr em perigo vidas humanas,
por meio da perda de controle de inundações, e a sustentabilidade
social, afetando a proteção de fontes de água fresca", enumera Hooper.
A visão mais ampla, de que as questões
ambientais têm impactos tanto no ambiente quanto diretamente no
desenvolvimento social, como descrevem os pesquisadores, será o tema
principal da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento
Sustentável, a Rio+20, que ocorre entre 13 e 22 de junho no Rio de
Janeiro. Apesar de avanços recentes, biodiversidade ainda é um dos temas
mais problemáticos, que devem despertar maior debate durante o evento.
"Temos que nos dar conta de que estamos observando uma perda da
biodiversidade sem precedentes nos últimos 65 milhões de anos.
Claramente estamos entrando na sexta extinção em massa (do planeta)",
disse à agência de notícias France-Presse Bob Watson, ex-chefe do painel
climático da ONU e principal assessor do ministério britânico de Meio
Ambiente.
Serviços ecológicos
Em ecologia, produtividade refere-se à
taxa de geração de biomassa em um ecossistema. É geralmente expressa em
unidades de massa por unidade de superfície de tempo, por exemplo:
gramas por metro quadrado por dia. Quanto mais biomassa, maior a
capacidade do bioma em se manter e prover serviços ecológicos, como
fornecer água e alimento.
MECA
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