O Brasil tem 4.283 escolas públicas que desde 2007, primeiro ano em
que foi possível avaliar a evolução do Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (Ideb), jamais conseguiram atingir suas metas
individuais calculadas pelo governo federal.
Os cálculos do levantamento incluem apenas as escolas de ensino
fundamental que tiveram o Ideb calculado nestes três anos. Segundo
levantamento feito pelo G1 a partir dos dados do último Ideb divulgados pelo Ministério da Educação,
1.828 escolas não conseguiram atingir a meta dos primeiros anos do
ensino fundamental, 2.232 escolas ficaram abaixo da projeção nas turmas
dos anos finais do fundamental e 223 escolas tiveram índices abaixo do
esperado em 2007, 2009 e 2011 tanto nos anos iniciais quanto nos anos
finais do ensino fundamental.
O Ideb foi criado pelo governo federal para medir a qualidade das
escolas e redes de ensino. Ele é calculado a cada dois anos desde 2005
com base no resultado da Prova Brasil e nas taxas de reprovação. Há
indicadores calculados para cada escola, rede de ensino, município,
estado e o país.
Todas as instituições públicas têm uma meta própria para alcançar a
cada dois anos nos últimos anos do ensino fundamental I e fundamental
II. A nota vai de zero a 10. A expectativa do governo federal é que, em
2021, os anos iniciais do fundamental brasileiro alcancem o Ideb 6,0.
Para os anos finais, a meta é 5,5 pontos.
As 4.238 escolas representam 13,8% do total de 31.042 instituições
que se encaixam nesta categoria. De acordo com o MEC, entre todas as
instituições, 7.126 têm turmas tanto do ensino fundamental I quanto do
ensino fundamental II, 15.392 só oferecem aulas dos anos iniciais do
fundamental, e 8.524 instituições são apenas para turmas a partir dos
anos finais do fundamental.
Mesmo sendo minoria, boa parte dos colégios abaixo da meta ainda não
dá sinais de que possa alcançar a meta, que sobe a cada Ideb: 1.221
delas viram o Ideb 2011 cair em relação ao de 2009, o que indica um
afastamento ainda maior da projeção feita pelo governo. Nesse grupo, 28
escolas estão nesta situação em ambos os ciclos do fundamental.
Atualmente, 2.475 colégios estão mais de 0,5 ponto abaixo do que o esperado para 2011.
Das 31.042 escolas com Ideb em todos os anos, 4.238 delas (ou 13,8%) nunca conseguiram atingir sua meta individual.
Dessas, 1.221 ficaram ainda mais longe da meta no último Ideb, e2.475 estão a mais de 0,5 ponto de atingir a projeção.
Apoio específico
O presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Luiz Cláudio Costa, afirma que o percentual de escolas e municípios que atingem a meta é “muito maior” do que o grupo de escolas aquém do esperado. Em entrevista ao G1, ele explicou que as escolas que enfrentam problemas para se manter dentro das expectativas recebem auxílio do governo, mas seguindo as autonomias de cada rede.
Uma das ações citadas por ele é o Mais Educação, programa para
escolas com aulas em tempo integral. “Quando temos problema no Ideb, uma
das coisas que temos procurado priorizar é a questão da escola em tempo
integral”, disse.
O governo espera que, até o fim do ano, 45 mil escolas ofereçam aos
alunos, além do turmo normal de aulas, atividades no turno oposto. Para
participar do Mais Educação, as escolas precisam se inscrever e passar
por uma seleção. O prazo para a adesão das instituições pré-selecionadas
em 2013 acabou em 31 de maio.
Além do ensino em tempo integral, o MEC ainda mantém diálogo com as
redes e esferas estaduais e municipais de governo, munindo os gestores
de dados para o planejamento pedagógico das escolas. O governo federal
criou ainda o Programa de Ação Articulada (PAR) para oferecer apoio e
recursos a escolas e redes interessadas em apoio mais ostensivo à gestão
educacional.
Distorções e revisão da meta
Entre as instituições que integram o grupo de escolas do fundamental que nunca conseguiram atingir sua meta, porém, não existem só instituições com têm resultados considerados ruins. Há exemplos de escolas com indicador acima de 6,0 e que já bateram a meta do Brasil para 2021, por exemplo. Mesmo com Ideb maior a cada ano e uma educação considerada muito acima da média do país, essas instituições ainda não conseguem alcançar a projeção calculada pelo governo.
Como o Ideb usou a base dos resultados educacionais de 2005, em
alguns casos, aquele ano específico pode não refletir a realidade da
escola. Por isso, a instituição acaba tendo que perseguir uma meta
incompatível com suas condições reais.
O movimento Todos pela Educação, que reúne empresários e
especialistas, também usou os mesmos dados para criar, em 2006, cinco
metas para a educação brasileira. A terceira também estabelece projeções
de resultados acadêmicos para escolas e redes de ensino. Segundo a
diretora-executiva da entidade, Priscila Fonseca da Cruz, a meta é
composta por três elementos: o que se quer medir, que resultado se
espera ter e qual o prazo desejado para obter este resultado.
Foi imaginado o esforço necessário para aquela escola avançar. A
melhoria em educação não é uma corrida de 100 metros, é uma maratona”
O primeiro elemento, para ela, é o que mais tem sido objeto de
estudos, mas a expectativa de que o ensino fundamental I no Brasil tenha
Ideb 6,0 até 2021 ainda é pouco debatida.
Tanto no caso da entidade quando no das metas governamentais, ela
defende que a elaboração de projeções com base em uma série histórica
seria mais precisa do que a partir de apenas um resultado. “Se você
olhar os resultados de um ano para o outro, eles podem oscilar. Mas
quando você pega uma série maior, você tem mais consistência para ver se
a escola está em uma curva ascendente, descendente, se é uma curva
ascendente ou acentuada, ou se é o que chamamos de ‘flat’, quase uma
reta. Com o histórico em mãos, seria muito mais preciso a gente traçar
metas intermediárias até 2021″, afirmou ela.
Ao G1, o presidente do Inep disse que a projeção do
Ideb foi feita a partir de estudos técnicos e científicos baseados em
avaliações internacionais, levando em conta também as especificidades de
cada escola. É por isso que duas escolas com Ideb idêntico em 2005 hoje
têm metas diferentes, diz ele. “Foi imaginado o esforço necessário para
aquela escola avançar. A melhoria em educação não é uma corrida de 100
metros, é uma maratona.” Ainda segundo ele, não há debate no governo
sobre a possibilidade de as metas serem revistas antes de 2021.
Reduzir o currículo para aumentar o Ideb
No segundo semestre de 2013, o governo aplicará a nova edição da Prova Brasil, um dos elementos que compõe o cálculo do Ideb. Segundo Angela Dannemann, diretora-executiva da Fundação Victor Civita, a grande divulgação do índice e a política de metas e expectativas para 2021 aumentou a pressão que a sociedade faz sobre bons resultados das escolas e sobre os gestores que cuidam da educação pública.
Se por um lado isso é positivo porque o Ideb é “o primeiro indicador
de qualidade” da educação brasileira, por outro Angela alerta que há
riscos de que as escolas desenhem seus currículos apenas para obterem
bons números no indicador do governo federal.
Em Goiás, por exemplo, o Ministério Público e a secretaria estadual
de Educação investigam denúncia de um conselho tutelar sobre sete
escolas suspeitas de expulsar alunos com mau comportamento e rendimento para melhorar seu Ideb e receber mais verba do governo estadual (veja reportagem ao lado).
O presidente do Inep afirmou que a maioria das escolas leva a sério a
tarefa de melhorar o Ideb através de projetos pedagógicos. “O que a
gente tem visto das redes é um grande esforço com muita seriedade,
trabalho e dedicação dos gestores e professores. Essa é a regra, e a
excepcionalidade não é tolerada nem pelo MEC nem pelos gestores
estaduais nem pelos municipais.”
Angela afirma que alguns estudos preliminares também já apontam
práticas “preocupantes” em algumas redes de várias partes do Brasil.
Alguns indícios mostram que elas decidiram aumentar a carga horária das
aulas de matemática e português nos primeiros anos do ensino fundamental
e eliminar ciências e artes. O objetivo é que os alunos dediquem mais
de seu tempo ao conteúdo que vai cair na Prova Brasil.
“Não pode haver redução de currículo para atender uma prova. Se só se
dá valor à prova, a gente está fazendo com as crianças uma redução da
aprendizagem”, afirmou ela.
Não pode haver redução de currículo para atender uma prova. Se só
se dá valor à prova, a gente está fazendo com as crianças uma redução da
aprendizagem”
Na Prova Brasil, são consideradas apenas as matérias de língua
portuguesa e matemática. De acordo com o MEC, a partir de 2013 as
questões de ciências vão ser inseridas, mas em caráter experimental, e
ainda não vão ser incluídas no cálculo do Ideb.
“Você não garante o objetivo e o direito de aprendizagem só olhando
de dois em dois anos. São muitas coisas em que temos que atuar ao mesmo
tempo. O Ideb é importante, mas você precisa ao mesmo tempo fazer
funcionar a escola com todo o conhecimento que precisa ser passado para
as crianças. A cada dois anos a gente avalia [em nível nacional], mas a
escola tem que avaliar a cada bimestre”, disse Angela.
A especialista defende que as redes do município e do estado, além da
própria escola, tenham que ter um plano para garantir o aprendizado
global dos estudantes, principalmente nos primeiros anos do fundamental,
quando o interesse e a curiosidade em aprender precisam ser fomentados.
“É o famoso projeto político-pedagógico da escola. Mas você precisa de
um professor preparado para atender isso, o professor precisa de melhor
formação. A meta tem que ser uma coisa que vai estimular o
desenvolvimento da escola e dos professores, não criar caminho paralelo
para atender índices.”
G1
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