"Um pesadelo. Era uma cena horrível, eles estavam todos presos dentro de
uma sala clara [o que dá a entender que não dormiam direito], cheio de
cocô no chão. Para você ter uma ideia, os nossos pés deslizavam no chão,
de tanto cocô que tinha no chão. Era um cheiro horrível", disse a
ativista, que não quis se identificar nem mostrar o rosto porque teme
que o instituto a encontre e leve os cães de volta ao laboratório.
Dezenas de ativistas derrubaram um portão e invadiram, por volta das 2h
desta sexta-feira, o laboratório do Instituto Royal, que fica a 59 km de
São Paulo. Eles levaram em carros próprios 178 cães que estavam no
complexo, motivados pelas suspeitas de que os bichos sofriam maus-tratos
no local, e registraram boletim de ocorrência. Um segundo boletim, por
furto qualificado, foi feito contra os ativistas, com base no relato dos
policiais que acompanharam a manifestação e a invasão no instituto.
Em 2012, após receber uma denúncia contra o instituto, o Ministério
Público de São Roque abriu uma investigação, ainda não concluída. "Foram
feitas duas visitas. Uma delas por uma veterinária de uma organização
internacional. Na época, nenhuma irregularidade foi encontrada", disse o
promotor Wilson Velasco Júnior. De acordo com ele, as pesquisas eram de
empresas de cosméticos, mas a lei permite que os clientes do
laboratório sejam mantidos em sigilo. Ele disse ainda que a prática de
vivissecção – a dissecação de animais vivos para estudos – é autorizada.
Amedrontado
O G1 foi ao apartamento em que estão dois cães do instituto. Os animais aparentavam estar contentes e brincaram durante a reportagem, apesar de um deles ainda estar "amedrontado" – ele tremia um pouco e pedia por carinho. "Ele está assim por tudo o que passou, pelas condições que estava vivendo", afirmou a ativista que levou os cães.
Ela e a amiga saíram da capital ontem por volta das 23h, de carro, para
encontrar o grupo de ativistas que entraram no laboratório para retirar
os cães. Ela disse que, quando chegou, as portas já tinham sido abertas
e que o grupo buscava as salas onde estavam os animais.
A ativista relatou que estava com um grupo de pessoas quando abriram a
porta de uma das salas e encontraram cerca de 40 cachorros. De acordo
com ela, os cães estavam separados por grupos em salas diferentes. "Eles
estavam trancados na sala. Tinha uma sala com uns com os pelos
raspados, outros em outra", disse. "Nós fomos pegando um a um e passando
de mão em mão", relembrou.
Os beagles que ficaram com a ativista foram trazidos para a capital
dentro do carro. "Eles estavam nervosos, vomitaram no caminho, foi muito
tenso", disse. De acordo com ela, as pessoas que participaram da ação
são de lugares diferentes. Ela mesma ficou sabendo do movimento pelas
redes sociais.
Além das duas amigas, uma terceira ativista, que também não quis se
identificar, ficou sabendo do movimento pela internet e saiu ontem da
capital, às 21h, para ajudar. "Eu não sabia o que ia acontecer. Eu nunca
imaginei que faria isso [levar os cães]. Eu fui lá mais para ajudar",
disse ela, que está com outros dois animais.
Agora, segundo as ativistas, a intenção e levar os cachorros para
tratamento em um veterinário e encontrar alguém que queira adotar os
animais. "Agora vamos levar para um veterinário para saber a situação de
saúde deles." A ativista disse que sempre gostou de animais. Ela tem
três cachorros em seu apartamento, todos vira-latas.
Instituto admite testes, mas nega maus-tratos
A gerente-geral do Instituto Royal, Sílvia Ortiz, que registrou boletim de ocorrência contra a invasão da empresa por ativistas ligados à associações protetoras dos animais, classificou o ato dos ativistas como terrorismo. Ela admite que a empresa realiza testes com animais, mas nega qualquer tipo de maus-tratos. Afirma ainda que o laboratório segue as regras e tem certificação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
No boletim de ocorrência de furto qualificado, policiais que
acompanharam a manifestação e a invasão no instituto disseram que
dependências do estabelecimento foram depredadas e que os cães ali
mantidos foram subtraídos. Eles afirmaram ainda que não houve agressões
por parte dos manifestantes contra seguranças do local.
Pastas com documentos, computadores, medicamentos e placas de acrílico
contendo o que parecem ser testes foram recolhidos e apresentados na
delegacia. Segundo o delegado Marcelo Sampaio Pontes, a polícia faria
uma perícia no local ainda pela manhã. Ele disse que a única coisa
comprovada até o momento é que os cachorros foram furtados.
O promotor Wilson Velasco Júnior afirmou que, em reunião com
representantes de ONGs na quarta-feira (16), orientou para que os
ativistas não invadissem o laboratório. "Quando eles invadiram e
depredaram o laboratório eles destruíram provas", afirmou. "É primordial
neste momento encontrar esses cães e apurar se eles podem causar algum
dano à saúde de outros animais e das pessoas. Também precisamos
examiná-los para saber se foram vitimas de maus tratos", completou o
promotor.
Nota de esclarecimento
A empresa Royal Canin, multinacional de origem francesa que fabrica alimentos para animais domésticos, divulgou uma nota na manhã desta sexta-feira (18) informando que, apesar da similaridade entre os nomes das duas empresas, não possui qualquer relação com o Instituto Royal.
G1
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