Quando eu era mais novo e começava a me interessar por astronomia, as
coisas eram bem mais simples. Estrelas eram gigantescas bolas de gás
incandescentes, produzindo sua própria luz. Do mesmo disco em que as
estrelas se formavam, planetas poderiam se formar, dando origem a
sistemas planetários. Sem massa suficiente para iniciar a reação de
fusão nuclear em seu interior, planetas estariam sempre associados a
estrelas, refletindo sua luz no espaço.
Mas as coisas mudaram muito de lá para cá e ficaram mais complicadas, mas, principalmente, mais interessantes!
Primeiro que planetas começaram a pipocar ao redor de vários tipos de
estrelas, desde estrelas quentes e jovens até estrelas mortas como
pulsares. Planetas rochosos, gasosos, pequenos ou grandes foram sendo
descobertos a partir da melhoria dos equipamentos e das técnicas de
observação. Hoje já são mais de 700 confirmados e mais de 3 mil
candidatos! Em segundo lugar, bem, aí vem o mais estranho.
Nesta semana, uma equipe da Universidade do Havaí anunciou a
descoberta de um planeta vagando solitário pelo espaço. Esse objeto,
chamado de PSO J3218.5-22 (PSO para os íntimos) foi encontrado na
constelação de Capricórnio, em um esforço observacional para se detectar
anãs marrons, um tipo de estrela que não conseguiu acumular matéria o
suficiente para iniciar o processo de fusão nuclear. Apesar disso, as
anãs marrons produzem radiação infravermelha, por causa da dinâmica de
seus gases. O objeto PSO surgiu justamente dos catálogos produzidos na
busca desse tipo de estrela. Aliás, esses catálogos têm, até agora, um
tamanho de 4 mil Terabytes, mais que a soma de todos os livros já
publicados, do que todos os filmes feitos e de todas as músicas já
escritas!
Depois de detectado, esse objeto foi acompanhado por 2 anos seguidos,
com observações precisas que permitiram deduzir que sua distância é de
80 anos luz apenas. Além disso, pelo seu movimento próprio, a equipe
liderada por Michael Liu conseguiu deduzir que o PSO pertence a um
conjunto de estrelas conhecido como “grupo móvel de Beta Pictoris”, que
teria se formado há 12 milhões de anos.
Ninguém sabe ao certo como esse planeta teria se formado, a primeira
hipótese é ele teria sido formado junto com as estrelas desse grupo e,
por interações gravitacionais mútuas, teria sido “estilingado” do
sistema. Essa hipótese encontra resistência por que o PSO tem 12 milhões
de anos também.
Outra ideia é que o planeta tenha se formado a partir do colapso de
uma nuvem de gás, tal qual o processo de formação de uma estrela, mas em
escala menor. Apesar de a ideia ser um tanto estranha, isso já foi
observado, pelo menos uma vez, é o caso de OTS44. Esse objeto está
cercado por uma nuvem e é possível observar gás caindo em direção a ele.
OTS44 tem, no máximo, 2 milhões de anos apenas e estaria ainda em
processo de acúmulo de matéria.
Esses dois objetos são considerados planetas, mas tem gente que torce
o nariz. Planetas se formam e, ao menos em princípio, se mantêm ao
redor de estrelas. O processo de formação através do colapso de uma
nuvem é a descrição do processo de formação de estrelas. Em termos de
massa, há um consenso, não muito firme, de que objetos com mais de 12
vezes a massa de Júpiter deveriam ser considerados estrelas, apesar de
alguns catálogos listarem planetas com 24 vezes a massa de Júpiter.
OTS44 tem massa de estrela (12 massas de Júpiter) e se forma como
estrela, mas ainda assim é considerado planeta. Já PSO tem apenas 6
massas de Júpiter, o que o deixa definitivamente na classe de planetas.
Se ele se formou como OTS44 está se formando, então as teorias de
formação de planetas vão precisar de uma boa revisão.
Além de ser um caso interessante, PSO deve ser o planeta solitário
menos massivo conhecido até agora, sua descoberta abre excelentes
perspectivas para o estudo de exoplanetas. Obter uma imagem de um
exoplaneta é muito difícil, pois o brilho da estrela é muito maior, o
que o ofusca. Estudos da atmosfera dos exoplanetas descobertos até agora
foram feitos de forma indireta. Agora, a descoberta de PSO nos dá a
oportunidade de estudar não só a composição química, mas também a
dinâmica de atmosferas dos exoplanetas de maneira direta.
G1
Crédito da imagem: MPIA / V. Ch. Quetz
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