Cientistas e economistas ligados à área ambiental não poupam críticas à pauta da Rio+ 20, a conferência da ONU sobre desenvolvimento sustentável que será realizada em junho. O físico e professor da USP José Goldemberg afirmou em São Paulo que o foco da conferência privilegia os problemas sociais e econômicos em detrimento da questão ambiental, que foi o tema central da Eco 92 e da conferência de Estocolmo, em 1972.
"Os preparativos para a conferência até agora apontam que ela não será coerente com as conferências de Meio Ambiente anteriores. O foco da Rio+20 foi esvaziado dos principais problemas que a ciência vem apontando nos últimos anos", diz Goldemberg, que ocupou a pasta de Meio Ambiente durante a Eco 92 e teve papel ativo na organização do evento, há 20 anos.
Goldemberg ressaltou que questões-chave para a sustentabilidade, como as mudanças climáticas, ficaram fora da Rio+20, a despeito dos crescentes alertas do meio científico sobre a questão e dos resultados mornos das últimas reuniões climáticas, que ainda não conseguiram fixar metas efetivas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. "A situação não é confortável. Não é porque a Grécia fará moratória que a atmosfera vai parar de aquecer", frisou.
Para o economista José Eli da Veiga, a discussão sobre os rumos da economia mundial e o combate à pobreza deve levar em consideração o cenário de escassez de recursos naturais e mudanças climáticas que vem sendo projetado há pelo menos 40 anos pelos cientistas. A questão principal, segundo ele, é se haverá tempo para que as economias emergentes, em crescimento, consigam ter ganhos de eficiência que compensem os efeitos do desenvolvimento baseado em combustíveis fósseis. "Países como a China têm reduzido a intensidade de carbono em seus produtos, mas o crescimento econômico e o aumento do consumo da população acabam anulando a queda nas emissões", disse.
O descontentamento do meio científico com a pauta da Rio+20 será oficializado em um documento que está sendo preparado por um grupo coordenado pelo embaixador Rubens Ricupero, José Goldemberg e o ambientalista e ex-parlamentar Fábio Feldmann. O documento pretende defender que a Rio+20 seja uma conferência ambiental, pois as condições planetárias que dão suporte à economia e o desenvolvimento social estão se deteriorando.
"É dado como certo que a temperatura da Terra irá se elevar entre 3ºC e 5ºC e a sensação é de que estamos marchando anestesiados para a Rio+20", disse Goldemberg, que afirma que ainda há tempo para corrigir os rumos da conferência --a cúpula dos chefes de Estado será realizada entre os dias 20 e 22 de junho, no RioCentro, no Rio de Janeiro.
TRÊS PILARES
O embaixador André Corrêa do Lago, chefe do Departamento de Meio Ambiente do Itamaraty, discorda da avaliação. Segundo ele, o tema central da conferência, o desenvolvimento sustentável, se apoia em três pilares - ambiental, social e econômico. "O pilar ambiental será forte na conferência. Não será o mais forte, mas terá o mesmo peso que os aspectos sociais e econômicos", afirmou o embaixador. Ele rebate as críticas de que os problemas ambientais não estão contemplados. "Só não vamos debater questões que já possuem uma agenda própria na ONU, como é o caso de mudanças climáticas. Mas temas pertinentes como água e cidades sustentáveis serão amplamente discutidos", diz Corrêa do Lago.
Para Giancarlo Summa, diretor do Centro de Informações das Nações Unidas para o Brasil (Unic), as críticas não procedem, pois a questão ambiental será um dos pilares das discussões e temas como biodiversidade, energia e desastres naturais estão contemplados. Ele ressalta que a Rio+20 será uma conferência política. "Temos de ter em mente que o resultado da conferência será um documento político, de reafirmar a vontade dos chefes de Estado com o desenvolvimento sustentável", diz Summa. "Não adianta firmar novos acordos ambientais se os compromissos assumidos na Eco 92 não forem implementados."
Folha de SP
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