Pesticidas usados por fazendeiros para proteger cultivos e colmeias podem embaralhar os circuitos cerebrais das abelhas melíferas
(produtoras de mel), afetando sua memória e sua capacidade de
navegação, necessárias para encontrar comida, alertaram cientistas nesta
quarta-feira. Matéria da AFP, no Yahoo Notícias, com informações adicionais do EcoDebate.
Segundo artigo [Cholinergic pesticides cause mushroom body neuronal inactivation in honeybees]
publicado na revista científica Nature Communications, isso poderia
ameaçar colônias de abelhas inteiras, cujas funções polinizadoras são
vitais para a produção de comida para nós, humanos.
A equipe de cientistas estudou os cérebros de abelhas produtoras de
mel no laboratório, expondo-as a pesticidas neonicotinoides usados em
lavouras, e a organofosfatos, o grupo de inseticidas mais usado no mundo
– neste caso, o coumafos -, às vezes utilizado para controlar
infestações de ácaros em colmeias.
Segundo os cientistas, quando expostos a concentrações similares dos
dois pesticidas encontradas no meio ambiente, os circuitos de
aprendizagem nos cérebros das abelhas logo param de funcionar.
“Juntas, as duas classes de pesticidas demonstraram ter um efeito
negativo maior no cérebro das abelhas e que podem inibir o aprendizado
das abelhas produtoras de mel”, explicou à AFP um dos co-autores do
estudo, Christopher Connolly, do Instituto de Pesquisa Médica da
Universidade de Dundee.
“As polinizadoras têm comportamentos sofisticados enquanto se
alimentam, que exigem que aprendam e se lembrem de tratos florais
associados à comida”, acrescentou sua colega, Geraldine Wright, do
Centro de Comportamento e Evolução da Universidade de Newcastle.
“A interrupção desta importante função tem implicações profundas na
sobrevivência de colônias de abelhas produtoras de mel porque as abelhas
que não conseguem aprender não conseguirão encontrar comida”, emendou.
A descoberta foi feita em meio a um intenso debate sobre o uso continuado de neonicotinoides.
Há duas semanas, países europeus rejeitaram uma proposta de proibição
por dois anos do grupo de inseticidas que atinge o cérebro, depois da
oposição da indústria agroquímica.
Apicultores (criadores de abelhas) de Europa, América do Norte e de
outras partes do mundo estão preocupados com o chamado distúrbio de
colapso das colônias, um fenômeno no qual abelhas adultas abruptamente
desaparecem das colmeias – algo que tem sido atribuído a ácaros, vírus e
fungos, pesticidas ou a uma combinação destes fatores.
As abelhas são 80% dos insetos polinizadores de plantas. Sem elas,
muitos cultivos seriam incapazes de frutificar ou teriam que ser
polinizados a mão.
Os cientistas afirmam que suas descobertas podem levar a uma reavaliação do uso de pesticidas.
“Nossos dados sugerem que o uso amplo de coumafos como acaricida é um
risco desnecessário para a saúde das abelhas melíferas”, afirmou
Connolly, que propôs o uso de ácidos orgânicos como sendo mais
apropriado para o controle de ácaros nas colmeias.
Em termos de pesticidas para a proteção de cultivos, a indústria
agroquímica argumenta que alternativas aos neonicotinoides seriam mais
tóxicas para as abelhas.
“Uma comparação direta das alternativas parece ser o único caminho” para encontrar a opção menos nociva, afirmou o cientista.
Em um comentário do estudo, o professor de Apicultura Francis
Ratnieks, da Universidade de Sussex, disse que as concentrações usadas
na pesquisa pareciam altas.
“Não surpreende que altas concentrações de inseticidas sejam nocivas,
mas não sabemos se os baixos níveis de inseticidas neonicotinoides no
néctar e no pólen de plantas tratadas também são nocivos no mundo real”,
acrescentou.
Além disso, o uso de coumafos é ilegal em grande parte da Europa e
não é amplamente usado nos Estados Unidos, afirmou Ratnieks, citado pelo
Science Media Centre, em Londres.
Nesta quarta-feira, apicultores franceses pediram ao Ministério da
Agricultura a proibição de pesticidas neonicotinoides, enquanto a
Comissão Europeia (CE) analisa a adoção de uma norma específica sobre o
caso.
“A situação é catastrófica”, disse Henri Clément, porta-voz dos
apicultores franceses, afirmando que a taxa de mortalidade das abelhas
passou de 5% na década de 1990 para 30% atualmente, o que provocou uma
redução dramática na produção de mel na França, para 16.000 toneladas.
Clément se reuniu com os legisladores, aos quais pediu apoio ao seu
apelo pela proibição dos neonicotinoides, e pediu a criação de um
“comitê de apoio a alternativas aos pesticidas”.
Este ano, a CE já propôs a suspensão do uso de três produtos
neonicotinoides nas culturas de milho, canola, girassol e algodão, pois
estes componentes contribuem para uma alta notável na mortalidade das
abelhas.
FONTE: NATURE e EcoDebate