quarta-feira, 28 de março de 2012

Cemitério de navios na Índia representa descaso ambiental e social


O maior cemitério de navios do mundo está localizado em Alang, uma cidade litorânea e industrial na Índia. Diversas embarcações provenientes de países desenvolvidos são atracadas nas praias de países asiáticos, para que trabalhadores, em situações subumanas, desmontem os navios.
Em 2011 o assunto inspirou uma das edições do programa Toda a Verdade, que vai ao ar pelo canal português SIC. A equipe de reportagem visitou os principais centros de desmantelamentos de navios, que também inclui Chittagong, em Bangladesh.
Durante as inspeções foram identificados trabalhadores em condições totalmente irregulares, expostos a acidentes e sem equipamentos de segurança, lidando com materiais altamente tóxicos. Além disso, é possível notar que a atividade rendeu altíssimo impacto ambiental à região.
Quando os navios saem de uso, todos os utensílios de valor, como mobílias, lustres e outros acessórios, são retirados e comercializados em antiquários. Feito isso, a parte bruta tem como destino os cemitérios, onde a estrutura será desmontada para ser reutilizada novamente na indústria. A Ásia é o destino preferido por ter mão de obra muito barata. Assim, desmanchar um navio em um destes cemitérios chega a custar cem vezes menos que o mesmo processo na Europa.
Conforme informado no documentário, a cada semana um navio atraca em Chittagong, Bangladesh. Em apenas três meses, os trabalhadores podem desmontar uma armação de 40 mil toneladas. Tudo o que provém do navio é revendido. Os equipamentos que não são revitalizados se transformam novamente em matéria-prima para a indústria. Os cabos estão entre as partes mais rentáveis de um navio.
Ao demonstrar como é feito este processo, a equipe registrou um grupo de homens trabalhando em um antigo navio japonês, na baía de Alang. Eles estavam separando placas de aço, cortadas sob a armação e ainda carregavam 40 mil quilos à mão, enquanto cantavam, sem luvas ou botas de proteção. Mesmo diante do cenário de evidente abandono para com os trabalhadores, o dono do estaleiro insistiu que são oferecidas todas as medidas de segurança necessárias. “É sem dúvida um trabalho perigoso. Tomamos todas as medidas para que haja segurança. Eles usam equipamentos de proteção, capacetes, botas, luvas e máscaras”, disse ele. No entanto, em nenhuma das ocasiões os trabalhadores foram identificados com o mínimo dos equipamentos. Pelo contrário, muitos deles trabalham até mesmo de chinelos.
Além da questão da segurança, outro problema evidente neste trabalho é a contaminação a que os funcionários e toda a população que mora na região dos estaleiros estão expostos. Existem diversos produtos tóxicos embutidos nos equipamentos dos navios, que são manuseados sem qualquer cuidado.
“Alguns trabalhadores antigos trabalham 20 ou 25 anos sem qualquer proteção contra amianto, PCB e outras coisas. Eles só pensam no dia de hoje e no dia de amanhã. Não é fácil alertá-los de que podem sofrer de câncer ao fim de dez anos”, disse o médico Tridib Ghosh, em declaração à TV portuguesa.
Mohamed Chain, que trabalha em ações contra a estrutura dos estaleiros explicou que é necessário haver um cuidado com as embarcações antes de elas atracarem na Índia, Bangladesh ou em outros estaleiros asiáticos. “A nossa recomendação é a seguinte: antes de enviarem navios a Bangladesh, eles devem ser limpos. Todos os detritos tóxicos que estão a bordo devem ser retirados do barco, pois não é bom para eles, mas é bom para nós”, declarou de forma irônica, em relação às nações desenvolvidas que descartam suas embarcações sem terem tomado as devidas precauções.
O cenário é triste. As praias, que há vinte anos eram repletas de palmeiras, hoje têm apenas barcos. A população local, que antes vivia da pesca, agora praticamente não tem o que comer. Além disso, os produtos tóxicos retirados do navio, que deveriam ser destinados a um tratamento adequado, são simplesmente enterrados nos arredores das praias, a dois metros de profundidade. Assim, quando a temporada de chuva chega, os resíduos são espalhados e levados até os rios.
O documentário é finalizado com uma frase bastante dura, dizendo que “em Alang os barcos não são os únicos a morrer”. O meio ambiente está exposto aos desastres causados pelo desmanche de navios e a população mais ainda. Entre os trabalhadores existem adolescentes, pessoas mutiladas e é bastante comum ouvir falar de acidentes fatais. Quando ocorrem mortes, os corpos são simplesmente jogados ao mar e em muitos casos as famílias nem ao menos recebem a notícia.
Os trabalhadores se expõem a condições precárias, em 14 horas diárias de trabalho para receber apenas 40 cêntimos por dia. Apesar das condições subumanas, os trabalhadores de Alang se viram obrigados a buscar esta alternativa após uma grave crise que atingiu a região indiana. Segundo a publicação francesa l’Humanité, em 2006, existiam mais cem mil pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza. Assim, os estaleiros soam como uma opção de trabalho que chega a empregar 25 mil pessoas.

Ciclovivo

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